domingo, 10 de fevereiro de 2013

Alguns gostam de poesia - Wislawa Szymborska

Alguns -
ou seja nem todos.
Nem mesmo a maioria de todos, mas a minoria.
Sem contar a escola onde é obrigatório
e os próprios poetas
seriam talvez uns dois em mil.

Gostam -
mas também se gosta de canja de galinha,
gosta-se de galanteios e da cor azul,
gosta-se de um xale velho,
gosta-se de fazer o que se tem vontade
gosta-se de afagar um cão.

De poesia  -
mas o que é isso, poesia
Muita resposta vaga
já foi dada a essa pergunta.
Pois eu não sei e não sei e me agarro a isso
como a uma tábua de salvação.


Poemas de Wislawa Szymborska; seleção, tradução e prefácio de Regina Przybycien - São Paulo: Companhia das Letras, 2011.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Canção amiga - Carlos Drummond de Andrade

Eu preparo uma canção
em que minha mãe se reconheça,
todas as mães se reconheçam,
e que fale como dois olhos.

Caminho por uma rua
que passa em muitos países.
Se não me veem, eu vejo
e saúdo velhos amigos.

Eu distribuo um segredo
como quem ama ou sorri.
No jeito mais natural
dois carinhos se procuram.

Minha vida, nossas vidas
formam um só diamante.
Aprendi novas palavras
e tornei outras mais belas.

Eu preparo uma canção
que faça acordar os homens
e adormecer as crianças.


Andrade, Carlos Drummond de. Poesia 1930-62. Edição critica, Guimarães, Julio Castañon (org.). São Paulo: Corsac Naif, 2012.

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Nihil ´- Antonio Cícero

nada sustenta no nada esta terra
nada este ser que sou eu
nada a beleza que o dia descerra
nada a que a noite acendeu
nada esse sol que ilumina enquanto erra
pelas estradas do breu
nada o poema que breve se encerra
e que do nada nasceu.



Cícero, Antonio. Porventura. Rio de Janeiro: Record, 2012.