sábado, 7 de novembro de 2009

Carta à Andréa Azulay - Clarice Lispector


Rio, 27 de junho de 1974



À bela princesa Andréa de Azulay,



dou-lhe de presente este objeto.Espero que você goste dele. Seu nome é móbile. Mas eu lhe dei sete nomes. O primeiro: la donna é mobile qual piuma ao vento (a mulher é volúvel como pluma ao vento). O segundo nome é: vertigem. O terceiro é: ano 2000. O quarto é: sussurros delicadíssimos. O quinto é: suspiros. O sexto é: pássaro azul. O sétimo é: Andréa de Azulay.

Quero lhe dizer, minha querida coleguinha, que a mais bela música do mundo é o silêncio interestrelar. E me desculpe: não posso ficar sozinha contigo porque senão nasce uma estrela no ar.

Você precisa saber que já é uma escritora. Mas nem ligue, faça de conta que nem é. Eu lhe desejo que você seja conhecida e admirada só por um grupo delicado embora grande de pessoas espalhadas pelo mundo. Desejo-lhe que nunca atinja a cruel popularidade porque esta é ruim e invade a intimidade sagrada do coração da gente. Escreva sobre ovo que dá certo. Dá certo também escrever sobre estrela. E sobre a quentura que os bichos dão a gente. Cerque-se da proteção divina e humana, tenha sempre pai e mãe - escreva o que quiser sem ligar para ninguém. Você me entendeu?

Um beijo nas suas mãos de princesa.



Clarice

Um comentário:

  1. Clarice,querida:
    Ler ou reler você é sempre uma operação feliz: descobrem-se coisas, aprimora-se o conhecimento das descobertas. Senti isto percorrendo "De corpo inteiro" e "Visão do esplendor".Obrigado, amiga!
    O abraço, a admiração, o carinho do
    Drummond


    É necessário dizer mais alguma coisa?

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