Eu também já fui brasileiro
moreno como vocês.
Ponteei viola, guiei forde
e aprendi nas mesas dos bares
que o nacionalismo é uma virtude.
Mas há uma hora em que os bares se fecham
e todas as virtudes se negam.
Eu também já fui poeta.
Bastava olhar para mulher,
pensava logo nas estrelas
e outros substantivos celestes.
Mas eram tantas, o céu tamanho
que minha poesia perturbou-se.
Eu também já tive um ritmo.
Fazia isto, fazia aquilo.
Meus amigos me queriam,
meus inimigos me odiavam.
Eu irônico deslizava
satisfeito de ter o meu ritmo.
Mas acabei confundindo tudo.
Hoje não deslizo mais não,
não sou irônico mais não,
não tenho ritmo mais não.
Alguma poesia-O livro em seu tempo/Carlos Drummond de Andrade; organização Eucanaã Ferraz- São Paulo: Instituto Moreira Salles, 2010
FEIRA DO LIVRO - PARTE 2
Há 21 horas
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